A psicoterapia é sempre um trabalho de mediação e reconciliação,
embora várias tendências terapêuticas tenham enveredado pelo caminho oposto,
enfatizando a autoafirmação, uma perspectiva unilateral da autonomia pessoal, a
separação e a luta, por exemplo, contra os pais, os destinos funestos ou as
pessoas consideradas más. Bert Hellinger, ousando chegar a
limites extremos, trilhou imperturbavelmente um caminho que pode abrir
dimensões novas (ou retomar antigas, de uma nova maneira) para a solução de
conflitos e o trabalho de reconciliação. É o próprio processo da
constelação que determina como iniciar a reconciliação ou o que é preciso
observar em cada passo. O terapeuta limita-se a olhar e a escutar a alma do
cliente e de sua família, abrindo espaço, com suas poucas intervenções, às
forças que resolvem os conflitos e atuam de forma reconciliadora. Seja qual for
o caso, abuso ou assassinato de filhos, trapaça financeira, paternidade
clandestina, traição, atrocidades de guerra, extermínio de judeus ou terrorismo
de qualquer espécie, as constelações mostram uma força incrivelmente
reconciliadora e liberadora, em que pesem as imperfeições e as tentativas
frustradas, superficiais ou mesmo traumáticas dos consteladores.
Embora Bert Hellinger e os
consteladores não estejam sozinhos nesse trabalho de reconciliação que honra
tanto as vítimas quanto os criminosos, o significado do “amor aos inimigos”
dificilmente é experimentado no domínio da psicoterapia e do aconselhamento de
forma tão sensível como nas constelações. Entretanto, não existem realmente
diferenças objetivas entre bons e maus? E a observação de que tanto as vítimas
quanto os criminosos estão a serviço de um destino maior, não abre ela as
portas para a arbitrariedade e a injustiça no comportamento humano? Não podemos
dizer que temos sempre uma resposta para isso, mesmo abstraindo de destinos
concretos. Muitas vezes, porém, um primeiro passo importante para a
reconciliação e a paz, apesar das oposições e mesmo da luta pela própria causa,
que frequentemente é necessária, é reconhecermos o adversário como igual a nós
e não nos considerarmos melhores do que ele.
Diariamente experimentamos que a
realidade costuma ser maior do que nossa vontade. Mesmo quando criamos uma
realidade, nem sempre podemos controlar as consequências de nossas ações. Um
dos efeitos profundos do trabalho das constelações é que nos ajuda a confiar no
desenvolvimento do sentimento humano, para além da culpa e das incriminações,
renunciando a flagelar nossos semelhantes como desumanos. Só entramos em
sintonia com a realidade quando também reconhecemos o funesto e o terrível como
fazendo parte dela, e lhes damos um lugar. Muitos desenvolvimentos positivos
recebem sua força e seu direcionamento desse reconhecimento e respeito pelo
terrível.
Jakob Robert Schneider